Foto: Banco de Dados
Os moradores da Cidade De Deus (CDD) realizaram, na tarde de 5 de janeiro, a segunda manifestação contra o assassinato de Marcelo Guimarães, trabalhador de 38 anos morto, segundo testemunhas, pela ação da Polícia Militar (PM) no dia anterior.
Os moradores e manifestantes se reuniram no local onde Marcelo foi assassinado. A família se juntou ao ato após o enterro que havia ocorrido em Inhaúma mais cedo naquele dia.
Em depoimento exclusivo ao AND, Guilherme, que trabalha na frente do local do assassinato e presenciou o momento do assassinato, afirmou:
– Não teve troca de tiro… Ele reduziu e o "Caveirão" deu um tiro. Ele caiu aqui, onde está a marca de sangue… O "Caveirão" deu a volta dando tiro para o alto, depois vieram com uma garrafa pet cheia de cápsula e jogaram aqui.
Indignada com a situação, a família fez diversas falas, durante o protesto, denunciando a política genocida do velho Estado e as ações covardes da PM. A filha de Marcelo, Vitória Guimarães, disse: “Nós queremos justiça, não só por ele, mas por todos aqueles que a polícia matou. Meu pai era trabalhador, diferente deles, que são bandidos e corruptos. O governo mata os pretos, pobres, favelados e o trabalhador. Meu pai era honesto, eles não são, essa é a diferença”.
A sogra de Marcelo, Claudia Lucia, disse: “O policial foi covarde! Ele tem que pagar!”. Carla, viúva de Marcelo, reforçou: “Não teve troca de tiro, meu marido foi assassinado!”.
Foto: Banco de Dados AND
Os manifestantes seguiram em marcha para uma praça central na CDD e, ao passar pela delegacia de polícia, o ato parou e os manifestantes ecoaram gritos tais como: Não foi confronto, foi assassinato! e Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar!
A PM esteve presente de forma ostensiva durante todo ato, com viaturas, blindado ("Caveirão"), policiais com fuzis e muitos deles com os rostos tapados. Cercando as ruas em volta do local e os manifestantes durante a marcha, os policiais foram vaiados e rechaçados pelas massas que gritavam: Assassinos e Não houve confronto.
No mesmo dia, em outro ponto do estado, em Niterói, no bairro do Fonseca, um outro protesto ocorria. As causas eram semelhantes: moradores do morro Santo Cristo acusaram a PM de assassinar dois jovens.
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COMENTÁRIO EDITORIAL
Este caso está longe de ser acidental, e é resultado da velha ordem social. Buscando justificar essa e tantas outras mortes de trabalhadores, vitimados por um verdadeiro genocídio, o velho Estado, através da PM, afirma sempre ser uma fatalidade, “bala perdida” etc., como se a desgraça que ocorre nas favelas e a morte “acidental” (a grande maioria, não é acidental) de inocentes fossem “efeito colateral” para eliminar a delinquência. Porém, como podemos perceber, o banho de sangue das forças policiais não só não elimina a delinquência, como essas forças se unificam; para combatê-la mesmo, seria preciso, ademais de solucionar os principais problemas que lançam os jovens a essa vida, concentrar-se na repressão aos verdadeiros bandidos: latifundiários, grandes empresários e políticos envolvidos, desde o alto de seus montões de dinheiro, com o narcotráfico internacional, comandado por magnatas que nada sofrem com as operações policiais nas favelas. Por outro lado, essa delinquência que cresce nos bairros pobres, da qual Marcelo e tantos outros não eram parte, é fruto de um massacre econômico que, no Rio de Janeiro, de maio a outubro, fez aumentar em 48% o número de desempregados (sem contar a legião de milhares de camelôs e outros trabalhadores às bordas da miséria completa). Primeiro, a velha ordem descarta e leva à delinquência um enorme contingente de jovens revoltados e desiludidos para, em seguida, matá-lo e, de sobra, matar também aqueles que não têm nenhuma relação com a delinquência, mas que são pobres e pretos potencialmente revoltados com tamanha exploração e opressão, sendo esse o seu "crime". Trata-se, este e todos os demais casos, não de acidentes, mas sim de uma sinistra perversidade, com o objetivo de controlar a revolta dos pobres - revolta contra toda a podridão e sofrimento que enfrentam - impondo um regime de terror policial, de choque. E a prova maior disso é a ameaça de um reles policial, um pobre-diabo insignificante que se acha autoridade para decretar o fim do direito à manifestação, sempre efetivamente negado às massas do povo.
Desde aqui, o AND se solidariza com a família e amigos do Marcelo e de tantos outros que, na escuridão dos becos, são alvos da sanha assassina do velho Estado brasileiro.
Foto: Comitê de Apoio AND Rio de Janeiro.